É sempre assim:basta uma série de elevações nos preços dos combustíveis para pipocarem engenhocas milagrosas que prometem reduzir o consumo do carro. E as ofertas são tentadoras, com economia de até 80% por um investimento baixo. Um deles é o carro movido a água com um kit que usa um reservatório de água para deixar o veículo mais econômico.
Por valores entre R$ 300 e R$ 1500, o chamado kit de hidrogênio utiliza a energia gerada pelo alternador do veículo para separar o hidrogênio do oxigênio presentes na água. Este processo chama-se eletrólise.
O hidrogênio então é direcionado ao coletor de admissão e entra em combustão junto com o combustível com o qual o carro está abastecido. Por ser altamente inflamável, proporciona uma pulverização menor do combustível original, gerando economia.
Se os fabricantes de carros soubessem que era tão fácil um carro movido a água, o equipamento já estaria presente nos motores há muitos anos, não é mesmo? Os investimentos para redução de consumo e emissões de poluentes atingem cifras bilionárias na indústria automobilística mundial e resultam em economia de 10%, no máximo 15%. Como um aparelho de R$ 200 pode representar 80% de redução?
De fato, o sistema gera hidrogênio e injeta na admissão. Porém, a energia fornecida pelo alternador é muito pequena para gerar uma quantidade significativa da substância. Assim, o hidrogênio resultante é tão pouco que não faz absolutamente nenhuma diferença no processo de combustão e não gera economia alguma.
Muito pelo contrário: por não ser homologado pelos fabricantes de veículos, pode causar danos ao motor e ainda resultar na perda da garantia. O kit hidrogênio, que tem um reservatório de água, é mais um daqueles mitos que sempre surgem no universo automotivo para tirar dinheiro de motoristas desinformados.
O carro movido hidrogênio já é uma realidade e bem diferente do carro movido a água com o kit milagroso descrito acima. Mas, antes de conhecê-lo, vale a pena saber mais sobre a substância hidrogênio. O hidrogênio é o elemento em maior abundância na crosta terrestre. Ele representa 75% da massa de nosso planeta.
Além disso, o gás é de extrema importância para as mais variadas atividades industriais e ciclos naturais. É um dos constituintes do Sol e também, juntamente com o oxigênio compõe a molécula essencial para a vida no planeta Terra, a água (H2O).
O hidrogênio pode gerar energia elétrica após um processo físico-químico que tem como produto a água. Esta é a grande sacada do carro a hidrogênio. Ele é abastecido por uma substância abundante e renovável, gera sua própria energia sem a necessidade de fontes externas e não emite poluentes.
O carro a hidrogênio tem um ou mais tanques de hidrogênio pressurizado, que é injetado na célula de combustível. Dentro dela, o gás se combina ao oxigênio presente no ar. Por meio de uma reação química, produz eletricidade que vai alimentar o motor elétrico que impulsiona o veículo. A única coisa que sai do escapamento é água ou vapor d’água.
Outra vantagem do carro a hidrogênio é o tempo de abastecimento dos tanques de gás pressurizado. Ele é semelhante ao de carros movidos a gasolina. Já nos elétricos plug-in, mesmo em estações de recarga ultra rápida, são necessários no mínimo de 15 a 30 minutos para obter 80% de carga.
A energia gerada pela célula de combustível pode ser prontamente utilizada pelo motor elétrico. Também pode ser armazenada em uma pequena bateria, menor, mais leve e mais barata do que os módulos que equipam os carros elétricos hoje em dia.
Em um carro movido a hidrogênio, o conjunto de tanques, célula de combustível e bateria pesa cerca de 90 quilos. Em um carro elétrico, os módulos de baterias chegam a 500 quilos. Com isso, a autonomia do modelo a hidrogênio é bem maior.
Falando em autonomia, o recordista mundial de autonomia entre os carros movidos a hidrogênio é o Toyota Mirai. Ele é produzido em série pela montadora japonesa. Em outubro de 2021, o modelo entrou para o Guinness Book ao percorrer 1.360 quilômetros com um único abastecimento de hidrogênio. O recorde anterior era do próprio Mirai e alcançado quatro meses antes: 1.003 km.
Como se vê, a tecnologia já existe e está bem desenvolvida. Prova disso é que a Toyota produz o Mirai desde 2014 e a Hyundai lançou o Nexo em 2018. A BMW deve lançar o SUV X5 a hidrogênio ainda em 2022 e Renault, Citroën, Opel e Peugeot já têm prontos furgões comerciais com a célula de combustível.